O mês de julho tem para mim alguns significados especiais: ainda há a esperança de participar de mais alguma festa junina atrasada, o frio que toma o cerrado goiano me deixa mais bem disposto e vejo por toda parte as manifestações de fé e direção ao Santuário do Divino Pai Eterno em Trindade.
Por muitas vezes caminhei em direção ao Santuário e lembro do quão reconfortante era, a cada dezena de quilômetros, ver a marcação do quanto tínhamos andado e calcularmos o quanto faltava para chegarmos à capital da fé goiana.
Na Roma Antiga, fazia-se uma “pedra de milhar” para indicar uma distância de uma milha – mais ou menos uns 1.481 metros – na estrada. Ao passar pela pedra, os romanos sabiam quantas milhas ainda tinham que percorrer. Em seguida, todos os caminhos levavam à Roma e bastava ter boca que se chegava lá.
Esse ano não fui à Trindade, mas passei por uma pedra de milhar muitos mais marcante que as indicações ilustradas com uma pombinha da via dos romeiros. Falo da ExpoCatólica, a maior feira de produtos católicos do mundo que ocorreu em São Paulo na primeira semana desse frio mês.
Talvez os mais puristas ou parapsicopuristas não gostem da ideia de que haja uma feira que explore o mercadológico da fé, mas antes que alguém faça um chicote e expulse os vendilhões do templo, é preciso fazer a justa explicação. Vivemos em uma sociedade capitalista e a mais simples estrutura paroquial pede que haja produção de bens católicos e isso, consequentemente, cria um nicho que pode ser rapidamente preenchido. A feira em questão começou com uma organização das muitas editoras religiosas pertencentes à congregações e logo foi aglutinando tudo que há de belo e moral.
Nos corredores da feira, o visitante encontra de tudo: terços, medalhinhas, camisetas, imagens, incensos, sinos, paramentos, projetos sociais, equipamentos de som, hóstias, arte sacra, turismo religioso, livros, faculdades, filmes e não sei nem mais o quê. Um padre consegue chegar na feira recém-ordenado e sair com uma grande paróquia toda montada com fiéis inclusos.
Digo “com fiéis inclusos”, porque a feira consegue atrair um grande público graças às formações, palestras e outros eventos realizados no local, sobretudo com a presença de influencers católicos, missionários digitais, músicos gospel e padres artistas. Tem catolicismo para tudo quanto é gosto e todos convivem em harmonia como nos primeiros séculos do cristianismo. Isso, é claro, porque não há os excessos e extremismos de ambos os lados tumultuando pelos corredores.
No ano passado, estive na feira como integrante do podcast Santa Zuera a convite do podcast Santo Flow. Gravamos um programa lá e até fomos entrevistados pelo podcast Follow me. Nessa ocasião, pude encontrar muitos ouvintes que acompanham o nosso trabalho e que manifestaram o seu carinho por meio de gestos, palavras, lágrimas e até presentes. Esses ouvintes, inclusive, foram responsáveis por uma comoção que impressionou os organizadores da feira. Resultado: fomos convidados para voltar esse ano com o nosso próprio estande.
Empolgadíssimos com a ideia de termos nosso próprio espaço para nos encontramos com os nossos, iniciamos diversos preparativos. Um dos preparativos, foi agilizar o projeto de publicação do meu livro Catequese dos Super-heróis.
O Santa Carona – empresa guarda-chuva administrada pelo famoso catequista gordinho Guilherme Cadoiss – possui uma série de projetos que visam todos uma evangelização no meio digital com uma linguagem acessível ao público leigo conferindo a todos uma catequese fiel ao Magistério católico. Nesse guarda-chuva se encontram projetos como o “Catequese com Farofa” (um curso que explica todos os parágrafos do atual catecismo maior), o “Formação para Catequistas” (um outro curso que visa formar catequistas segundo o diretório nacional para catequistas da CNBB), o “Vox Fidei” (um clube de leitura da Bíblia no qual eu mesmo, Carlos Neiva, estou lendo e explicando toda a Bíblia, versículo por versículo) e, é claro, o “Santa Zuera” (um podcast com conversas informais de amigos católicos sobre a doutrina e história da Igreja).
Somando a todos esses projetos, eles criaram a editora Via Petrina que publicará material doutrinário voltado para catequese e evangelização, e é aí que entra o meu livro.
Apesar do título ser “CATEQUESE... dos Super-heróis”, não se trata de uma exposição doutrinal do credo católico. Usei a palavra no sentido metafórico, pois “catequese” vem do verbo grego κατηχέω que significa “instruir em viva voz”, afinal, os super-heróis fazem uma instrução ética com seu exemplo vivo nas histórias em quadrinhos, desenhos e filmes de cinema. Nesse sentido, o livro se trata de uma propedêutica á ética das virtudes e à filosofia aristotélica. Trata-se de uma coletânea de ensaios de forte influência chestertonina na qual cada super-herói, da Marvel ou DC Comics, serve de ilustração para a apresentação de uma virtude essencial. É claro, por “virtude essencial”, entenda tanto as virtudes cardeais como algumas virtudes derivadas como coragem, força de vontade e benevolência como também virtudes essencialmente cristãs como humildade, amor e pureza.
Ou seja, o meu primeiro livro é não-ficcional e traz uma abordagem filosófica sobre a cultura pop. Algo não muito diferente do que já fiz em diversos outros momentos da minha vida, como no programa (também do Santa Carona) “Hora do Chá” ou ainda na minha monografia de filosofia na qual analisei a virtude da amizade na obra O Senhor dos Anéis, de J. R. R. Tolkien. Como é possível perceber, o mundo nerd, a literatura e a filosofia andam de mãos dadas no meu espírito.
Enfim, impressos os livros marchamos para São Paulo. No primeiro dia, montamos o estande e quinta-feira, dia 03, já estávamos prontos para receber os visitantes. Já nesse dia fizemos uma série de gravações de podcast com pessoas incríveis e que serão disponibilizados no devido momento no canal do Santa Zuera. Num revezamento de equipe, participei de alguns bons momentos:
Comecei gravando com o Martinho, dono da fábrica de incensos Milagros. Sua história de vida é fantástica e ele é simpaticíssimo! Em seguida, gravei com o prof. Filipe Santos um bate-papo sobre a teologia da libertação e descobri que ele, assim como eu, é profundamente nerd e católico. Também gravei com o Prof. Eduardo Faria, que lançou um livro relatando sua conversão do presbiterianismo ao catolicismo e que rendeu um bom episódio. Por fim, gravei um episódio com o Pe. Edson, o padre gamer que chama a atenção nas redes sociais por “streamar” jogos enquanto fala de Deus sem afetações. Esse último programa encerrou minha noite com chave de ouro, pois o Pe. Edson é uma pessoa extremamente simpática, humilde e agradável.
Após um sushizinho de lei para arrematar o dia, a sexta-feira começou bem agitada, pois chegamos cedo para receber o lendário Prof. Felipe Aquino. Gravamos com ele e foi o auge do meu dia. Para quem não está por dentro, o Prof. Felipe Aquino possui mais de oitenta livros sobre catolicismo e responde dúvidas sobre a fé num programa na Canção Nova há mais de duas décadas. O sujeito é um gigante e muito do que aprendi sobre a fé católica foi com ele.
Em seguida, gravamos com o secretário do Dicastério Romano de Comunicação que nos contou um pouco dos bastidores do conclave e como o alto escalão do Vaticano enxerga a presença dos católicos na internet. Depois gravei com a banda Rosa de Saron e também foi incrível! O dia seguiu com mais gravações, mas eu já estava esgotado. Minha voz estava falhando e eu ainda tinha o grande dia de sábado pela frente. Mesmo assim, extravasei num karaokê com uns amigos enquanto eu secava o Palmeiras.
No sábado, minha manhã foi ocupada: conversamos com a criadora da ExpoCatólica, a maravilhosa Kiara Castro e aprendemos muito sobre o que acontecia ali. Em seguida, gravei com o Prof. Rafael Nogueira um bate-papo interessantíssimo. Logo depois, foi a vez do diácono Alexandre Varela, do blog “O Catequista”, nos contar um pouco sua trajetória e falarmos como é tentar ensinar a fé católica num terreno tão plural como a internet.
Às duas da tarde, realizei o lançamento do meu livro. Um bom número de pessoas esteve presente para prestigiar e foi sensacional. Meus amigos podcasters Max, Hian e Guilherme Cadoiss fizeram a leitura de trechos do livro que gostaram e eu fiz um momento de perguntas e respostas com meus futuros leitores. E seguida, começamos os autógrafos e fotos e fomos com tudo até a última assinatura após aproximadamente quatro horas de fila. Foram quase quatrocentos exemplares vendidos!
Mas a noite ainda tinha mais para oferecer: após um programa excelente com o Prof. Victor Sales sobre a Doutrina Social da Igreja, gravamos um programa com o enérgico Pe. Marlon Múcio. Se você não sabe quem é esse homem, eu tenho o prazer de te explicar: ele é um padre da diocese de Taubaté que sofre com a Deficiência do Transportador de Riboflavina (RTD), que é uma doença bastante rara. Com essa doença, ele não devia ter sido ordenado padre, na verdade, ele nem deveria ter chegado à vida adulta. Por uma questão genética, as células do corpo dele não carregam energia, o que deveria matá-lo ou ao menos deixá-lo extremamente fatigado. Entretanto, o padre é um exemplo de energia e bom humor. Com sua voz de locutor – típica da formação dos padres mais velhos – ele ri da própria situação, ensina com o exemplo a não reclamarmos dos revezes da vida e ainda dá glória a Deus por tudo que passa. Ele chegou a criar um hospital especializado em doenças raras, a Casa de Saúde Nossa Senhora dos Raros. Para dar conta de tudo, ele usa um aparelho de respiração e ingere mais de trezentos comprimidos por dia. Que energia boa foi estar ao lado dele! Melhor ainda foi ver ele ficando empolgado com meu livro e prometendo devorá-lo.
Exaurido, capotei de vez para estar firme para o último dia. Participei de uma missa extremamente bem celebrada nos bastidores já de manhã. O que é algo bacana de se dizer: o evento traz muitas pessoas, mas não faz shows da fé. Não há nenhuma missa aberta (só para os expositores) e nenhum show. A feira atrai por ser interessante por si só e não por se utilizar da fé de maneira mercadológica. O próprio arcebispo esteve presente parece acompanhar tudo atentamente.
No domingo, fiquei mais tranquilo. Gravei apenas um programa gravado de modo relâmpago com o Pe. Joãzinho e com o Pe. Fábio Marinho (eles estão lançando um livro juntos com o Pe. Zezinho). Autografei noventa livros comprados na pré-venda que seriam enviados pelos correios e visitei alguns poucos estandes. Era o último dia da feira e eu não tinha conseguido ver nada.
Visitei os estandes da Uni Ítalo e da Sabatini, patrocinadores do Santa Zuera e fizemos algumas fotos e vídeos. Também visitei o estande da Milagros, e ganhei muitos mimos da Renata, esposa do Martinho. Minha casa agora tem um cheirinho especial com os novos incensos que eu ainda não conhecia. Por fim, a Aramon, fábrica de artigos religiosos, me apresentou sua nova linha de produtos e me presenteou com alguns itens maravilhosos e o terço mais bonito que já tive na vida, um terço de São Carlo Acutis cheio de fotinhas do beato que será canonizado em setembro desse ano.
Voltando para casa na segunda-feira, bastante cansado, peguei uma forte gripe, mas já estou melhor e pronto para o que vier. Sinto-me como um peregrino que caminhou por longos metros na via dos romeiros. O corpo está cansado, mas a fé está revivida. Ao ver essa ExpoCatólica 2025, vejo uma pedra de milhar. Nos meus trinta anos, sonhando em ser escritor desde a infância, pude não só ter um livro publicado, mas ver uma série de pessoas demonstrando o seu carinho e adquirindo o livro desejosos de lê-lo. É isso, aconteceu! Sou um escritor oficialmente! Não falo dos muitos blogs que fiz desde os meus doze anos, nem dos cadernos de histórias que – no máximo – viraram aventuras de RPG. Eu publiquei um livro! Um livro meu, com as minhas ideias e do meu jeito. Espero que as pessoas gostem do que lerem, pois eu estou satisfeitíssimo com o trabalho! Daqui para frente, há uma caminhada demarcada que não me será tomada e que marca o quão bem fundamentada essa romaria da minha vida é. Que venham outras pedras de milhar, mas essa aqui já está posta.
P.S.: Para quem tem interesse em adquirir o livro, a editora vai organizar algum lançamento para vender as poucas dezenas que sobraram aqui na cidade de Anápolis mesmo. Depois disso, e eu não sei dizer exatamente quando será, deverá haver uma reimpressão e uma organização de como vender para todo o país. Como disse, a editora está começando e muita coisa foi adiantada para a ExpoCatólica, mas agora vai ter que ser organizada. Em todos os casos, entre em contato com a editora no Instagram (@viapetrina) para tirar qualquer dúvida.